Tive um furo, ou melhor dizendo, o pneu do meu carro furou! E então são aqueles momentos da descobertas das maravilhas do nosso mundo moderno. Primeiro, fica-se a saber que antigamente o pneu sobressalente era um pneu igual aos outros e agora é uma rodinha ridícula, a vergonha de todas as rodas que se prezam, mais pequeno que os outros pneus e pintada a uma cor absurda, com um letreiro garrafal a dizer que não pode andar a mais de oitenta à hora. Já não basta o embaraço de ficar no meio da estrada naqueles propósitos, ainda se segue depois aquela humilhação do olha aquele furou! Mas há mais! O macaco que vem no carro é um verdadeiro saguí, o liliput de toda a genealogia simiesca, espécie de alavanquinha absurda com a qual se tem que alçar o carro à força de braço, na singular posição de estar metade do tempo de cócoras e outra metade de joelhos, os intervalos agarrado aos rins. Ainda por cima, para ajudar à festa, a coisa tem todo o ar de se desconjuntar a todo o momento e cair-nos o carro em cima de um pé. Agora com os coletinhos verdes fosforecentes, um tipo nestes ademanes vê-se à meia-légua. Dirá quem me lê que o meu problema foi ter sido apanhado nesta. Não, não foi, porque consegui arrumar-me para uma ruela sossegada. Ironia do destino era em frente de uma escola de condução, onde se calhar ensinavam num quadro como mudar teoricamente um pneu. O que mais me desassossegou foi uma amiga minha dizer-me num amigável e carinhoso «coitado de ti só te faltava esta» que «um furo, que é coisa que quase não há». Pois é, minha querida, quase não há mas houve: e foi hoje e comigo, na estrada de Sintra. E não foi ao volante de um Chevrolet, nem pela estrada do sonho!