27.2.06

Interpretação consoladora

Com a mania de andar por tudo quanto é alfarrabista, como quem anda ao trapo ou ao ferro-velho, encontro, por vezes, momentos de insólito e de confronto com a minha própria mania. Exprimiu-se desta vez a loucura coleccionadora na forma de um livrinho encadernado que na magra lombada mais não tinha do que umas iniciais: «V.S.». Era, afinal, a compilação de modestos estudos de um professor liceal, chamado Vítor Santos, do Redondo. Textos minúsculos, editados entre 1926 e 1945, eles iam desde uns aforismos a uma novela, incluindo uma compilação de detalhes sobre a sua terra e uma conferência no Ateneu de despedida dos seus alunos. Não sei porque o comprei, arriscando doze euros, que bem podiam ter trazido dois Camilos na edição popular, de tal modo tudo aquilo é desesperadamente humilde. Consolo-me ao menos, porque um dos pensamentos, do folheto «Ditos e feitos, mal ditos e mal feitos», reza que «isto de doidos ou de ajuizados é só uma questão de interpretação». Ao menos isso, porque já ninguém me aceita o livro de volta e nem eu, que daqui o olho carinhosamente, sei o que haverá nele para ler.