16.2.06

«A Luta» continua

Um tipo dorme três manhosas horas já pela madrugada, e depois de um dia de trabalho bestial chega e tropeça num monte de mais serviço que se acumula até ao telhado e os telefonemas que não fez, os prazos que devia cumprir, as gentilezas que ficaram no olvido. Um tipo, esquecido de si e ignorado pela maioria dos outros, afunda-se num sofá, como se cama fosse, e ao tirar os sapatos, faz disso um mimo e um carinho, como se só a isso tivesse direito. Um tipo saca da estante um livro a esmo, um livro qualquer, e lê o que lhe apetecia ter já como epitáfio mortuário, ao menos para morrer a rir: «aqui jaz Bento Bexiga, que acendeu um fósforo, para ver de tinha gasolina no depósito do carro; e tinha mesmo!». Eis o resumo de um dia. Escreveu-o Alexandre O' Neill, em 3 de Agosto de 1976, num jornal de que ainda fui Advogado. O jornal, que se chamava «A Luta» faliu, eu ainda por cá ando, de fósforo na mão.