De quando em vez uma pessoa perde-se. Quando dá por si anda por aí, sem rumo, com a ideia de que deveria ter outra vida a seguir àquela em que se vai esgotando.
Os meus pontos de referência são os livros que vou acumulando sem ler e mais os que vão ficando lidos até metade.
Esta noite, envergonhado enfim de tanta ausência, peguei no «Tempo Escandinavo», o livro que José Gomes Ferreira escreveu por causa da circunstância de, aborrecido com o Direito, ter sido cônsul na Noruega.
O exemplar que tenho encontrei numa alfarrabista em Campo de Ourique, chamada Crisálida - de que já falei aqui - e ainda é na edição da defunta Portugália, de Agostinho Fernandes esse mecenas que o ganhava nas conservas de peixe para o afundar no mar da cultura.
Folheei-o, uns contos pelo meio à espera de mim, outros já sublinhados, pois que lidos já nem sei há quanto tempo.
É um livro macio de sensualidade, não a do amor ginástico e secreto, mas o de «um turbilhão de bocas vivas», «com unhas nas palavras e nos silêncios».
Foi lá que vi que os portugueses se convencem «que possuem o segredo de embebedar as mulheres com palavras».
Livro magnífico, narrativa de solidão e amor efémero em que «a sombra tem carne feminina», prometo continuar com ele, mas não hoje, compreende-se!