Hoje é um dia em que a Natureza resolveu que chovesse. Dei por isso quando estava já na rua, um livro para continuar a ler. Li, a «A Hora de Estrela», da Clarice Lispector, que prossigo, maravilhado com ela e por sua escrita seduzido.
Na história, Macabea conheceu Olímpico de Jesus, metalúrgico. Ela seca de carnes, encardida e de «cheiro murrinhento», dorida por ser feia.
Namoram sem se amarem, indispondo-se até ao silêncio.
Na hora de se separarem, tentando ser amável e não a ofender, ele diz-lhe: «você é um cabelo na sopa. Não dá vontade de comer». Ela, «rindo por não se lembrar de chorar», pediu-lhe que lhe dissesse logo adeus, abreviando o fim.
É uma história triste, de amores desencontrados com gente vulgar.
Na parte em que estou surge Glória, um «estardalhadaço de existir», a quem ele se agarra com «a força de um zangão», porque «ela lhe daria mel de abelhas e carnes fartas».
Clarice Lispector faleceu a um dia de fazer cinquenta e sete anos de idade, vítima de um cancro fulminante. Este livro escreve-o como se fosse o homem que «reduzira-se a si». Nascida na Ucrânia, escrevia para não morrer.