Agora que recomecei a ler, lembro uma frase que, na folha anterior do conto do Mário de Sá Carneiro, dizia: «é que, nada há que torne alguém mais lisonjeiro ao povo do que a lenda». Curioso! Antes de me decidir por ele, estivera a folhear um livro, dos que ainda hei-de ler, pelo qual se continua a edição das obras do José Cardoso Pires, com quem me reconciliei, conhecendo-lhe, enfim, a obra. E sucedeu que, ao virar as folhas desses «Dispersos», ainda li, de soslaio, um artigo que ele publicou no falecido «Diário de Lisboa», em 7 de Abril de 1969 chamado «A estratégia do requiem» e onde, a propósito precisamente das «impunidades que a morte facilita», diz precisamente do escritor morto: ele repousa, está dócil e moldável às recuperações que queiram fazer da sua obra. Agora, sim, passou a ter existência contemporânea. Expõe-se à lenda, é um presente intemporal, e já não compromete aqueles que o ousem tocar». Ora eis que, com esta ideia da existência contemporânea dos que se foram, agora me vou.