9.9.08

Raios o partam!

Consegui acabar de ler a correspondência entre o José Régio e o Vitorino Nemésio. Esperava algo de grandioso, terminei com uma mediocridade gritante. Às cartas entre ambos a edição junta outras, de Alberto Serpa, Adolfo Casais Monteiro e João Gaspar Simões, todas a propósito do que é afinal a ideia do livro, porque esta edição obedece a uma ideia: um conflito literário, feito de «desentendimentos provocados por boatos e picardias de ambas as partes, que terão origem, entre outros factos, na notícia publicada na Presença dando conta do lançamento da Revista de Portugal, tardiamente e omitindo o nome do seu director». Palavras das organizadoras Isabel Cadete Novais e Manuela Vasconcelos.
Estou atónito, aturdido de espanto e minado de incompreensão. Porque se edita um livro destes com a fradilqueirice do pior que o humano tem, mesmo quando o humano são escritores?
Na sua carta de 17 de Agosto de 1938 Nemésio invectiva Casais Monteiro: «ainda bem que V. me deixa a alternativa de malcriado, para eu me livrar da sua acusação de "desonestidade" na nefanda interpretação que dei ao caso da separata (...)». Numa carta desse mesmo tempo Régio dizia a Nemésio: «você, afinal, não soube sacrificar os seus pequenos ressentimentos pessoais a uma coisa que a revista estava sendo».
É este o estilo geral de um epistolário em que no princípio se trocavam pétalas de mimos adjectivados em rosas e verbos de enleantes heras de fraternidade cultural.
Enfim, uma choldra! «O meu pessimismo a respeito da grande maioria dos homens não tem senão crescido», escreveu Régio a Nemésio em 7 de Julho de 1937. O meu também. Edições destas ajudam à bandalheira, ao descrédito, ao fastio, à ideia de que nada muda e há nos grandes cultivados a mesma miséria moral que nos alarves analfabetos que deles se riem.
Maldito livro, pois, mal empregado gasto, não fosse eu não querer ficar com a Obra Completa do Régio afinal incompleta.
Copio da carta com que fecha o livro, escrita pelo Adolfo Casais Monteiro ao José Régio, em 29 de Outubro de 1938. «Citando a sempre oportuna frase do Pessoa: seja como o for, raios o partam!». É isso mesmo, raios os partam a todos, incluindo os que tiveram a peregrina ideia!