10.9.05

Azul metileno

Fui comprar o jornal e trouxe-o para casa. Era pequeno e azul. O título era pomposo: «Literatura Portuguesa no Mundo». No fundo era um primeiro volume de uma pequena enciclopédia sobre literatura portuguesa, distribuída com um jornal. Vêm nela os autores, com minúsculas bio-bibliografias. Não cheguei a ver se vinham todos, ou se viriam os mais importantes desses autores. Vi foi que a obra tinha fotografias: logo duas do Eugénio de Andrade, e mais duas do Manuel Alegre, mas nenhuma do Ruben A., como se o importante fosse ajudar a esquecê-lo. Algumas dessas fotografias trazem legendas como uma da Rua Augusta a dizer: «a protagonista de grande parte dos contos de Avenida de Roma é a cidade moderna». O a-propósito é que «Avenida de Roma» [letra «A»] é um romance de Artur Portela [Filho]. Mas a obra traz títulos de livros. E aí é que a coisa se complica. Livro dedicado à primeira letra do alfabeto, encaixa em «A», a martelo, o livro «Amor é fodido, O» um romance do Miguel Esteves Cardoso, que, já agora, se calhar cabia melhor na letra «F». É claro não traz a «Aparição», como se fosse um livro sem importância alguma, que obviamente nem valesse a pena referir, assim dando espaço para as «Aparições», explicando que é uma «colectânea de poesias de Guilherme de Azevedo». Naturalmente, colectânea incontornável! E assim sucessivamente. Prometo comprar os outros todos, jornal a jornal. São momentos de bom-humor garantido. Do Lobo Antunes o azuláceo opúsculo publica com destaque uma foto acompanhada de um (1942-) para que se perceba que o homem ainda não morreu e adita-se-lhe a legenda «António Lobo Antunes foi várias vezes proposto para o Prémio Nobel da Literatura», lembrança apta a irritar o autor até à apoplexia, o que dá ao traço um valor simbólico nada despiciendo.